sexta-feira, 24 de junho de 2011

Como se portar na infelicidade
Estamos todos ligados à fortuna: para uns a cadeia é de ouro e frouxa, para outros é apertada e grosseira; mas que importa? Todos os homens participam do mesmo cativeiro, e aqueles que encadeiam os outros não são menos algemados; pois tu não afirmarás, suponho eu, que os ferros são menos pesados quando levados no braço esquerdo. As honras prendem este, a riqueza aquele outro; este leva o peso da sua nobreza, aquele o de sua obscuridade; um curva a cabeça sob a tirania de outrem, outro sob a própria tirania; a este sua permanência num lugar é imposta pelo exílio, àquele outro pelo sacerdócio. Toda a vida é uma escravidão. É preciso, pois, acostumar-se à sua condição, queixando-se o menos possível e não deixando escapar nenhuma das vantagens que ela possa oferecer: nenhum destino é tão insuportável que uma alma razoável não encontre qualquer coisa para consolo. Vê-se frequentemente um terreno diminuto prestar-se, graças ao talento do arquiteto, às mais diversas e incríveis aplicações, e um arranjo hábil torna habitável o menor canto. Para vencer os obstáculos, apela à razão: verás abrandar-se o que resistia, alargar-se o que era apertado e os fardos tornarem-se mais leves sobre os ombros que saberão suportá-los.

SÊNECA. Da tranquilidade da alma, Col. Os Pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1973. p. 216

Se


Rio de Janeiro. 23°. A promessa da limpeza da alma. A lembrança de momentos felizes. Só lá se podia pensar na alegria sem propósito, isso porque em seu lugar o trabalho só servia para financiar a satisfação garantida. Ela pensava no Cristo Redentor. Tantos medos, tantas emoções. Era hipocondríaca, claustrofóbica, sentia pena do animal abandonado, acreditava no mistério divino, e se contentava com pouco; então por que agora toda essa angústia sem fim? Sua vida estava tão previsível, e isso era reconfortante. Tinha com quem se casar, fazer planos, sabia a cor do pano de prato do dia seguinte, o que faria no jantar, com quem iria se encontrar... E de repente aquela imensa vontade de caminhar pelo calçadão de Copacabana. Pensou, se tivesse dinheiro moraria ali. Se tivesse coragem, se pudesse se arriscar... se, sempre se. “ Ai ai, aiai saudade, não venha me matar”. A duvida é sempre a mesma. Por que a vida, por que tudo isso? Fechou os olhos, pensou que podia ser diferente. Talvez se mudasse de emprego, ou o corte de cabelo. Talvez se gostasse de rock. Na verdade, era pra ser tudo bem simples, era humana, passível de doenças, de alegrias, de tristezas, de dores de parto. Que tal um banho de mar? A cura de tudo está na água salgada. Bem que podia tomar um banho de sol, um banho de sal, perder a noção do tempo, se perder, de encontrar, sentir o vento no corpo todo, os pés na areia, o calor do Sol, Ah!O calor do Sol. A vida pulsa, o pulso ainda pulsa! Não adianta, e nunca vai adiantar, o sol, O cristo, a morte, o nascimento. Ela nunca conseguirá desanuviar o mundo. Ele engole. Tudo.

sábado, 18 de junho de 2011

Mundo mundo, vasto mundo... Muda, mude, moda, modos. Se eu pudesse me transformar, hoje assumiria a forma de uma tartaruga. Dentro do casco, protegida, vagarosa, no meu tempo e no meu espaço. Já amanhã gostaria de ser uma águia. Cheia de garras e com olhar profundo. Tenho olhado pra pessoas com olhos de animal. As semelhanças são tantas! Existem pessoas que são quase um bicho vestido, interessantíssimo! Esquilos, raposas, cobras, aranhas, todos aprisionados nos bons modos e nos padrões de linguagem. Como uma borboleta, a busca pela liberdade engana. Quando menos espero, já me envolvo e me prendo em regras transcendentais, e aí, mais uma surpresa: sem prisões o mundo não tem graça! Só não se pode restringir as rédeas a pequenos espaços corporais. Enquanto isso minha imaginação trabalha como uma locomotiva, me leva a espaços siderais nos quais nunca pensei em estar, e esse ócio produtivo vai fazer com que toda a minha vida se transforme. Susto! De repente gente chega, encanta, surpreende, e deixa claro que o homem pode ser bicho, mas ao invés de veneno possui magia.